Prof. Godofredo
Pinto
Dezembro/2009
0.Introdução
Este texto sobre a problemática dos
partidos políticos visa complementar, através de um enfoque mais abrangente, a
minha análise, expressa em “Reforma Política: uma prioridade nacional?” (de
setembro de 2009), na qual enfatizo meu entendimento de que não será mediante
mudanças na legislação partidária e eleitoral que se superaria, de forma cabal,
o atual quadro de descrédito porque passam estas instituições, ainda que
algumas alterações legais possam e devam ser feitas topicamente para se
minimizar um pouco a situação crítica destas agremiações.
Em verdade, penso que a questão central desta
problemática é de natureza ideológica e, portanto, filosófica.
Daí porque, com a cautela que cabe a um leigo, adentro um pouco na seara da
História da Filosofia na Era Moderna (quando os partidos políticos foram
criados) e dos dilemas ideológicos dos séculos XX e XXI, apesar de saber que o
faço com certo grau de esquematismo simplificador – fato decorrente, seja da
circunstância de não ser eu um expert
na matéria, sendo apenas um leitor eventual de trabalhos filosóficos, seja por
não ser o caso aqui de elaborar nenhum tratado profundo sobre temática
filosófica (do que, aliás, eu não seria capaz), visto que o objetivo básico
deste texto é o de expressar, a partir de um enfoque à esquerda, a minha
avaliação sobre “os partidos políticos na crise da representação”.
1. A Filosofia e a ação
política
A por todos reconhecida grave
crise de credibilidade das instituições representativas da sociedade
contemporânea, das quais os partidos políticos e as entidades vinculadas aos
movimentos sociais são parte, tem, no meu entender, várias razões, sendo uma
delas a causa fundamental: a crise mais geral do pensamento filosófico “clássico”, expresso nas
grandes totalizações sintéticas, como dizia Sartre, das quais macrosistemas
filosóficos como o cartesianismo, o liberalismo (Locke), o kantismo, o
hegelianismo e o marxismo são exemplos tão marcantes.
Em verdade, no mundo ocidental, de
meados do século XVII até o último quartel do século XX, grandes totalizações
filosóficas foram prenhes de racionalismo iluminista, vale dizer, de crença na
Razão humana, de fé nas potencialidades do Homem de sempre melhor dominar os
conhecimentos acerca da Natureza e de si próprio, e de otimismo quanto a um
destino histórico generoso, progressista e eticamente elevado para a
Humanidade. Também floresceu, neste período, o empirismo iluminista, segundo o
qual a fonte do conhecimento é a experiência sensível – e não a Razão
metafísica - e o Saber científico viabilizaria um controle sobre a natureza que
propiciaria a instauração da harmonia e bem-estar entre os homens. O certo é
que, malgrado as diferenças essenciais existentes entre as diversas filosofias
do Iluminismo (séc.XVII – séc.XIX), havia um “astral” comum, um horizonte utópico
instigante, uma perspectiva positiva subjacente a todas elas – um “espírito de época” -, que consistia na
postura dos indivíduos de servirem-se do intelecto de maneira livre, autônoma,
produtiva e, acreditava-se, propiciadora da evolução das sociedades humanas. A
prevalência, naquele período histórico, de uma galvanizadora perspectiva
totalizante no ideário de tantos quanto vanguardeavam processos políticos,
sociais, culturais e acadêmicos, infundiam nos militantes de cada uma das
várias áreas da atividade humana transformadora e criativa, um norte
ideológico geral, balizador de suas reflexões e práticas atinentes a seus
campos próprios de atuação na sociedade e, portanto, instigador de práxis mudancistas voltadas para a
emancipação do ser humano.
No campo político, filosofias grandiosas deste jaez,
informaram e suscitaram apaixonados engajamentos a movimentos coletivos
radicalmente transformadores, como foram os casos da Revolução Gloriosa inglesa
(séc.XVII), das Revoluções Americana e Francesa (séc.XVIII), das Revoluções de
1848 e da Comuna de Paris (séc. XIX), das Revoluções Russa e Chinesa (séc.XX),
dentre tantos outros. De fato, é sabida a decisiva influência que o iluminismo
dos Enciclopedistas (Diderot, D’Alembert, Voltaire, d’Holbach, Rousseau, Montesquieu,
Buffon, dentre outros 150 autores) – muitos deles sintonizados com o ideário de
cunho empirista dos britânicos Bacon e Locke (séc.XVII) e Hume (séc.XVIII) –
exerceu sobre as revoluções burguesas, assim como teve o marxismo sobre as revoluções
socialistas. Sobretudo entre os séculos XVII a XIX – período em que se deu a
ascensão histórica e a afirmação hegemônica da burguesia no mundo ocidental no
contexto da Revolução Industrial -, o élan
psico-cultural de “alto astral” era predominante na “opinião pública” dos
países desenvolvidos, especialmente no “Século das Luzes” (séc.XVIII). Para um
ambiente cultural tão positivamente estimulante, contribuíram decisivamente as
grandes obras da Ciência deste período (de Galileu, Descartes, Newton, Leibniz
e Gauss nas matemáticas e na física; de Boyle, Dalton e Lavoisier na química;
de Harvey, Pasteur e Darwin nas ciências biológicas), as descobertas e
invenções técnicas revolucionárias (do telescópio ao heliocentrismo planetário
moderno, da Geometria Analítica ao Cálculo Infinitesimal, das leis da
Gravitação Universal às do Eletromagnetismo, da teoria atômica moderna à lei da
conservação da matéria, da Teoria da Evolução das Espécies ao Materialismo
Histórico, da fisiologia da circulação sanguínea à vacina, da apologia do livre
mercado de Adam Smith à mais valia do capital de Marx, da máquina a vapor à
lâmpada incandescente, do tear mecânico ao telefone, da difusão dos periódicos
impressos ao telégrafo, dentre tantas outras), a Reforma Protestante feita por
Lutero e Calvino (com a fundamental afirmação do indivíduo enquanto agente
independente, sem mediadores humanos na sua relação com Deus via livre exame da
Bíblia, única fonte da fé), além das inovadoras formulações da iluminista Ética
racionalista, calcada no valor da liberdade, de grandes filósofos como
Espinosa, Fichte, dentre outros.
Macrosistemas filosóficos não são
mais dominantes no cenário cultural de hoje. Atualmente, com a crise de
credibilidade relativa a tais macrosistemas filosóficos, que não mais dão conta
de explicarem cabalmente e sinalizarem prospectivamente (como fazia, por
exemplo, o marxismo com seu “determinismo histórico” no sentido de uma
redentora “sociedade sem classes”) questões atinentes a novas condições
histórico-sociais vigentes neste globalizado mundo da internet, da robótica, da
nanociência, da engenharia genética, dos transplantes, da clonagem de animais,
da psicofarmacopéia em expansão
acelerada – e que nos antepõem dilemas graves, sobretudo éticos -, o que passou
a reinar nos militantes políticos em geral é a falta de um alternativo sentido
histórico amplo que seja capaz de balizar rumos estratégicos e informar
propostas transformadoras de caráter mais abrangente, que permitisse reverter o
atual quadro de grande apatia, descrença e distanciamento dos cidadãos dos
movimentos e entidades de representação da sociedade.
Se a esta revolução
técnico-científica em curso agregarmos um desenvolvimento econômico-social do
capitalismo hoje estruturalmente distinto daquele de caráter fordista-taylorista
baseado na produção em série em grandes unidades industriais, nas quais
trabalhavam um crescentemente numeroso operariado – contexto este (o da 2ª
Revolução Industrial) que fora subseqüente ao da 1ª Revolução Industrial, tão
profundamente analisado por pensadores do porte de um Adam Smith, de um David
Ricardo ou de um Karl Marx -, percebemos que não há mais teorizações que tornem
plenamente inteligível a atual dinâmica geral de um sistema globalmente
hegemonizado pelo capital financeiro, no qual há uma significativa redução
relativa do peso econômico e político da classe operária tradicional em função
do crescimento impactante dos setores de serviços, e onde já desponta uma
“economia verde” como uma nova área de extraordinário potencial expansivo. Daí,
cabe a inquirição: o que advirá do atual sistema produtivo? Quais mutações
econômico-sociais haverão de ocorrer? Afinal, não há o “fim da História”...
A falência do neoliberalismo e da
economia burocraticamente planejada do dito “socialismo real”, o descrédito da
social-democracia e de instituições como o FMI e o Banco Mundial, o crescente
questionamento do dólar como moeda dominante da economia internacional – o que
põe em cheque o sistema geopolítico e econômico montado para o pós-guerra em
Bretton Woods -, situam este início do séc.XXI como uma fase de transição
histórica que está a requerer uma ampla e profunda Teoria – em verdade, uma
Filosofia que presida um novo Saber que, tendo em conta as conquistas da
Ciência contemporânea e utilizando métodos originais de pensamento, seja capaz
de iluminar uma melhor compreensão do Mundo atual, de propor uma renovada Ética
humanista, e de embasar uma Teoria Política que oriente os militantes das
causas libertárias a construírem estratégias de luta em prol de um Planeta mais
justo, humanizado e ecologicamente sustentado. Afinal, a História tem
demonstrado que cada época coloca, na ordem do dia, potencialidades, desafios,
dilemas e impasses críticos, que induzem a criação de uma Filosofia que
enfrente e supere criativamente problemáticas atinentes às necessidades
concretas e exigências culturais dos setores sociais em ascensão, Filosofia
esta que permanece efetivamente viva enquanto estiver sintonizada e iluminar a práxis coletiva que a engendrou.
2. O Século XX e seu
ideário controverso
O Século XX conviveu com dois grandes
campos filosóficos: o iluminista (com suas duas vertentes – a racionalista e a
empirista) e o contra-iluminista.
Em verdade, desde os primórdios da
Era Moderna estes dois campos filosóficos coexistiram; só que, do final do
séc.XVII até meados do séc.XIX, a clara dominância do “otimismo” iluminista - embasado
numa dinâmica histórica de enormes avanços científicos e profundas
transformações culturais a serviço da afirmação do novo sistema
econômico-social capitalista - fez com que visões “pessimistas” e “anti-racionalistas”,
antagônicas ao Iluminismo, subsistissem um tanto à margem da corrente
intelectual hegemônica na época.
De fato, também o séc.XVII conviveu
com importantes filosofias essencialmente antagônicas. Na primeira metade deste
século, para além do surgimento do grande sistema racionalista de Descartes,
aparece o pensamento sui generis do filósofo inglês Thomas Hobbes. Ele foi um
empirista (rejeitava as “idéias inatas” da Razão cartesiana) que valorizava a
racionalidade científica, tendo construído sua obra via método lógico-dedutivo.
Assim sendo, ele deve ser considerado um dos precursores do Iluminismo.
Contudo, sua visão “egoística” da natureza humana (“o homem é o lobo do homem”)
e da sociedade (cujo “estado natural” seria o da “guerra de todos contra
todos”); sua doutrina política reacionária (era um defensor do Absolutismo
Monárquico; contra os poderes do Parlamento) pró-despotismo político – mesmo
defendendo que, em nome da preservação da paz social através do poder da
“espada”, o poder total do soberano deveria ser fruto, não de um suposto
“direito divino”, mas sim de um pacto voluntário dos indivíduos consubstanciado
num contrato social -, expressavam uma concepção “pessimista” do Homem e da
vida, que contrastava com o espírito iluminista que viria a se impor
crescentemente nos anos finais de sua vida.
Por outro lado, também em meados do
séc.XVII, impõe-se como expressivo marco filosófico o pensamento de Pascal –
outro contendor de Descartes -, com sua visão trágica da condição humana, sua
afirmação dos limites da Razão (a despeito de ser ele um dos maiores gênios da
história da Ciência), seu reconhecimento da inteligência do “coração” (“o
coração tem razões que a razão desconhece”) e, pois, do conhecimento pela fé.
Após ele, o contra-iluminismo como que hibernou por mais de 1 século, sufocado
que estava pelo prestígio intelectual do Iluminismo, sem que nenhum filósofo de
grande influência se contrapusesse ao modo de pensamento cientificista baseado
no modelo matemático-dedutivo e no exame das experimentações concretas que
norteava a busca da Verdade, da ordem e da harmonia nas Ciências da Natureza,
na Ética e nas relações sociais.
Somente no final do século XVIII, o
romântico Schelling, seguido no séc. XIX pelo pessimista Schopenhauer, pelo
existencialista Kierkegaard, pelo trágico Nietsche, dentre outros, recolocaram
na cena filosófica visões “antirracionalistas” tais como a revalorização da
Arte como forma superior de conhecimento; a relevância, para um autêntico
saber, de características da subjetividade humana como as paixões, a intuição,
a vontade, a fantasia poética; o resgate filosófico das tradições e mitos
históricos – especialmente das tragédias e da mitologia gregas -, do saber
místico, do profetismo alegórico, da análise simbólica e do estudo das
linguagens ao longo da história; a descrença na adequação e veracidade plena do
modelo ideal e abstrato da Matemática para todo conhecimento; enfim, a crença
de que a inteligência estética é superior à inteligência teórica (do
racionalismo) e à inteligência prática (do empirismo).
Tal elenco de filosofias expressava,
de um lado, uma reação ao caráter absoluto atribuído à Razão metafísica na
filosofia mais em voga na época – a de Hegel -, e de outro lado, uma rejeição
ao empirismo mecanicista e à fria visão cientificista do pensamento iluminista
que, tal como entendia Newton, julgava que a Matemática e as experiências
práticas seriam capazes de tudo explicar (pensamento este, contudo, incapaz de
dar conta de impasses intelectuais fundamentais não resolvidos); expressavam
também uma contestação a um modus vivendi
cada vez mais mercantilizado e opressivo – realidade tão bem descrita por Marx
no Manifesto Comunista -, que se
contrapunha ao apregoado ideal iluminista de uma sociedade plenamente racional
e generosa.
Assim, foi neste contexto filosófico
e cultural dúplice – iluminista e contra-iluminista – que a civilização
ocidental adentrou o século XX, que no seu início viu ocorrer a
extraordinariamente impactante tragédia da 1ª Grande Guerra Mundial, que deu
fim à belle époque da dominação
burguesa do planeta.
A esta hecatombe, seguiu-se a
consolidação da Grande Revolução Russa e a eclosão da Grande Depressão
econômica no mundo capitalista, culminando este processo de dramáticas
convulsões sócio-econômicas e políticas com a deflagração da 2ª Grande Guerra
Mundial, a que se seguiram a constituição dos regimes de “socialismo real” no
Leste Europeu e as vitórias da Grande Revolução Chinesa, das lutas pela
independência nacional de tantas nações colonizadas da Ásia e da África, além
das conquistas dos direitos políticos e civis dos trabalhadores, das mulheres e
das etnias discriminadas. Ademais, para além da vigência da Guerra Fria por
mais de 40 anos após a 2ª Guerra Mundial, houve simultaneamente, por um lado,
uma grande expansão da democracia política em inúmeros países do mundo, e por
outro lado, uma grande presença de regimes autoritários baseados em
fundamentalismos religiosos e ou étnicos que, mercê de visões xenófobas e
discriminatórias, afrontam os direitos civis e políticos conquistados por
tantos milhões de cidadãos (ãs) em tantas partes de nosso planeta. Outrossim,
temáticas como as da livre opção sexual e da ecologia, ganham crescente espaço
no ideário de nossa cidadania desde o último quartel do século passado.
Se a este quadro de enorme convulsão
social e política, somarmos o advento de descobertas científicas que, desde
meados do séc. XIX, começaram a “balançar o coreto” de pilares básicos da visão
de mundo da elite intelectual de então – a começar pela dos cientistas
“clássicos” -, pode-se compreender quão abaladas ficaram as convicções daqueles
que julgavam inquestionáveis certos princípios fundamentais de poderosos sistemas
científicos – como o de Newton, por exemplo. Afinal, disto são exemplos: a
criação de geometrias não euclideanas (que retiram o caráter “absoluto” da
noção de espaço tida por milênios como natural e indiscutível); os diferentes
entendimentos lógicos sobre o que “é” cada
número natural (os de Bertrand Russel, Zermelo e Von Neumann; logo, não há uma
única Matemática); as polêmicas sobre o conceito de “infinito” (com a recusa de inúmeros matemáticos – inclusive dos
intuicionistas – de aceitarem como válidos ramos inteiros da Matemática, como é
o caso da Aritmética Transfinita); o surgimento da construtivista lógica
matemática intuicionista (em contraposição à lógica clássica no questionamento
relativo ao princípio do terceiro excluído e, pois, quanto à prova por redução
ao absurdo, dentre outras questões). Também, já no séc.XX, alicerces da física
clássica newtoniana – conceitos absolutos e independentes como espaço e tempo –
foram questionados pela Teoria da Relatividade de Einstein, na qual espaço-tempo
forma um “sistema” interrelacionado num espaço “curvo” não euclideano; a
Mecânica Quântica - especialmente atinente aos movimentos no mundo microscópico
– tem leis e princípios não sintonizados nem com a Física Clássica nem com a de
Einstein (princípios como o da Incerteza e o da não vigência do conceito de
trajetória de uma partícula); ou seja, questões tão chocantes e surpreendentes
que frustraram o almejado “sonho” de se construir um só sistema
físico-matemático aplicável a todos os desafios da Ciência. As problemáticas
profundamente perturbadoras para todos aqueles que tinham uma visão científica
convencional tiveram sua culminância, nos anos 30 do século passado, com os
Teoremas de Gödel, que demonstravam que nenhum sistema matemático que contenha
a aritmética dos números naturais será simultaneamente consistente (livre de
contradições) e completo (toda verdade matemática do sistema é nele
demonstrável). A prova de Gödel de que a Matemática – a “Rainha das Ciências” –
tem seus limites intrínsicos de validade, foi um impactante golpe na lógica e “bom
senso” tradicionais.
Porém, por mais que perturbadoras
descobertas da Matemática, da Lógica e das Ciências Naturais tenham contribuído
para a consolidação de uma “sensação” de “falta de chão” quanto ao arcabouço
mental das pessoas que tinham na racionalidade científica uma referência maior
do seu modo de pensar e agir, tais questões científicas eram afetas a um
restrito número de especialistas, não atingindo diretamente a psique do grande
público intelectualizado - salvo, talvez, a Teoria da Relatividade. Todavia, no
início do século XX, uma inovação científica revolucionária iria
definitivamente “balançar o coreto” das cabeças de todo mundo, a saber, a
análise do inconsciente de Freud. O viés “antirracionalista” e
“pessimista” da teoria freudiana é evidente (o agir humano foge ao controle da
Razão, e nossa psique é fundamentalmente influenciada, desde a infância, por
impulsos, como os da libido, objetos tanto de repressão castradora quanto de
sublimação criativa). A amplíssima divulgação que tais descobertas tiveram,
fizeram com que a Psicanálise passasse a fazer parte, cada vez mais, do
cotidiano do nosso mundo, aumentando sobremaneira o peso da relativização dos
valores, das controvérsias, perplexidades e insegurança conceituais do cenário
ideológico vigente no século passado (e ainda presente também, em certa medida,
neste nosso século XXI), com fortes impactos, especialmente no campo ético.
Assim é que, ao longo do
conturbadíssimo século XX, o mundo ocidental vivenciou uma ferrenha luta entre
três grandes sistemas filosóficos e políticos: o marxismo (de raiz iluminista),
o liberalismo (de raiz iluminista), e o nazi-fascismo (de raiz
contra-iluminista). Esta luta desdobrou-se, ora com maior peso ideológico e
político de um dos sistemas, ora de outro (tendo havido, politicamente,
“soluções híbridas” entre as duas correntes iluministas – a socialdemocracia),
encerrando-se o século passado com a preponderância do redivivo ideário liberal
de Locke e Adam Smith.
3. A crise do marxismo
e a contribuição de Sartre
A última grande totalização sintética
que até 40 anos atrás moveu o Mundo de maneira radicalmente profunda foi a
Filosofia Marxista. Esta Teoria filosófica, econômica e política, que tão
extraordinariamente estimulou a criatividade e a práxis revolucionária de
milhões de pessoas ao longo do século XX, recebeu aportes muito importantes de
possantes pensadores e líderes políticos (tanto “revolucionários” quanto
“reformistas”) que vão, dentre vários outros, de Lenin a Garaudy, de Trotsky a
Vygotsky, de Gramsci a Lukacs, de Kautsky
aos da Escola de Frankfurt – Horkheimer, Adorno, Benjamin, Habermas,
Marcuse, Fromm -, e sobretudo do Jean Paul Sartre dos anos 50, que buscou
integrar lúcida e criativamente seu existencialismo ateu ao marxismo - que ele
considerava a “filosofia insuperável de nossa época” -, mas que estava, a seu juízo, estagnado,
operando com conceitos esquemáticos desencarnados e impotentes, incapazes de
uma análise concreta da vida das pessoas, reduzido a um “empirismo sem
princípios”, a um apriorístico “saber puro e coagulado” na análise de fatos
históricos e de realidades sócio-econômicas, sendo enfim uma “doutrina imensa”
– com a qual tinha “um acordo de princípio” com o materialismo histórico, mas
não com o materialismo dialético (isto é, com a Dialética da Natureza) -, que
ainda “está por fazer” (“não está para ser revista”), necessitada que estaria
de uma revitalização que lhe restituísse a sensibilidade perdida para a
realidade concreta. Para Sartre, os marxistas contentavam-se com esquemáticas,
fetichizadas e, pois, simplórias interpretações do mundo e da vida. Isto porque
os marxistas seus contemporâneos faziam uso, de forma muito apressada, de
sínteses conceituais totalizantes demasiado abstratas – do tipo “intelectual
pequeno-burguês” para caracterizar, por exemplo, Paul Valéry e Gustave
Flaubert, ou também “proletariado francês”, sem maiores especificações -, pouco
trabalhando com as indispensáveis mediações que enriqueceriam o conhecimento
real a ser produzido no percurso entre os dados brutos da realidade e o
conceito sintético utilizado. Por isso, para a elaboração de tais mediações,
Sartre defendia a incorporação ao arsenal teórico marxista – com eventuais
correções -, de concepções atinentes a disciplinas como a Psicanálise (algo que
membros da Escola de Frankfurt também fizeram) e a Sociologia, vistas então com
um certo desmerecimento preconceituoso por tantos marxistas “revolucionários”.
Ademais, Sartre estendia tais críticas ao então muito em voga estruturalismo
(seja o de Lévi-Strauss, seja o do marxista Althusser), bem como polemizava
também com os existencialistas não marxistas.
De fato, penso que a análise de
Sartre é muito procedente quando expõe as carências do pensamento marxista na
atualidade. Sua crença no resgate do marxismo enquanto a mais potencialmente
profícua filosofia de nosso tempo, ficou demonstrada, não só no seu sistemático
e sempre empolgado apoio militante aos movimentos libertários e a regimes
revolucionários socialistas, mas especialmente no ingente trabalho teórico que
desenvolveu, tendo contribuído com uma muito densa elaboração filosófica –
tendo enriquecido o elenco de conceitos tradicionais do marxismo com novos
conceitos básicos -, visando fundar a validez teórica da razão dialética
marxista, expressa no texto Questão de
Método, ensaio introdutório de sua inconclusa obra Crítica da Razão Dialética. Outrossim, a própria obra de Sartre, e
a situação crítica vivida pelos partidos ditos marxistas, são relevantes
indicações de que, mesmo ainda sendo a menos impotente das filosofias
existentes, o marxismo hoje padece de insuficiências que o tornam um sistema de
pensamento incapaz de atender plenamente as demandas intelectivas de uma intelligentsia às voltas com
perplexidades conceituais crescentes nos dias que correm. De qualquer modo, até
porque não concluiu sua obra teórica enquanto pensador marxista, Sartre
contribuiu mais na identificação e análise das insuficiências e das questões em
aberto no pensamento filosófico atual, do que na plena construção de uma
“solução” para a problemática filosófica geral que se propusera viabilizar.
4. Partidos políticos:
do esvaziamento atual a um futuro incerto
Os partidos
políticos, atualmente, vêm sofrendo um processo de erosão quanto às funções
públicas que tradicionalmente exerceram; isto em decorrência do incrível
desenvolvimento e expansão dos serviços telemáticos e da confusão ideológica
hoje reinante.
Até o último quartel do século
passado, o partido político era, nas democracias consolidadas, um
valorizado porta-voz e mediador coletivo das demandas e interesses de
classes ou grupos sociais junto aos órgãos do Estado e à “opinião pública”. Na
sociedade informacional de hoje, os meios tecnológicos permitem o acesso amplo
e direto do cidadão às autoridades estatais para manifestação de sua opinião
acerca das questões de interesse público e possibilitam a ação coletiva em rede
via internet, gerando movimentos de pressão sobre as instituições à revelia dos
mecanismos partidários. Na era das votações instantâneas – vide Big Brother
Brasil e quejandos -, na qual parlamentares, gestores e juízes podem ter
ciência da “vontade política” de uma “opinião pública” difusa mediante acesso a
posicionamentos isolados ou “organizados” em rede internética, ou ainda, via
pesquisas de opinião, das duas, uma: ou os
partidos políticos se reciclam radicalmente, redefinindo suas estruturas
organizativas e deliberativas, e acima de tudo, reavaliando suas reflexões
programáticas – o que é o mais complexo a ser feito, face à ausência
de novas filosofias políticas que expressem uma perspectiva utópica com
possibilidades de realização e cujos fundamentos estejam sintonizados com o
novo mundo em curso (ausência esta que explica a significativa “pasteurização
ideológica” e o tal discurso acomodado e conservador de que teriam acabado as
distinções entre direita e esquerda) e a prática abusiva do mais deslavado
pragmatismo político vigente entre as maiores agremiações partidárias (a ressalvar,
a nitidez doutrinária dos pequenos partidos situados nos extremos do espectro
político, quase todos eles enredados numa dogmática já historicamente superada),
ou então, por inadaptação à nova era
telemática e por carecerem de um discurso ideologicamente sedutor e
instigador das grandes massas, verão se esvair ainda mais o papel político
e a relevância social que outrora encarnaram. Afinal, como instituição
histórico-social que é, o partido político moderno – assim como o sindicato -,
nascido e desenvolvido na Europa iluminista, com a função pública acima
descrita, poderá perecer por não ter mais serventia relevante diante das novas
exigências e possibilidades colocadas pela “pós-modernidade” da nova etapa do
capitalismo ora vigente. Tal indesejada possibilidade é uma das mais
preocupantes conseqüências, no médio prazo, da grave e crescente crise da representação da cidadania que
já nos aflige profundamente.
Todo este quadro tem como pano de
fundo decisivo, um contemporâneo contexto ideológico onde reinam visões de
mundo fragmentárias, parcelares, abertas ao irracionalismo, à intolerância, ao
racismo, à violência, à corrupção, à xenofobia, aos misticismos, exoterismos e
fundamentalismos religiosos e étnicos, configurando uma ambiência sócio-cultural
obscurantista, apesar do extraordinário avanço tecnológico que presenciamos
hoje em dia. Afinal, a História não se cansa de mostrar a realidade de uma coabitação
efetiva de um alto grau de desenvolvimento educacional e tecnológico com uma
visão místico-irracional dominante, da qual a experiência do nazismo, na
cultíssima Alemanha, é o exemplo recente mais eloqüente.
De fato, a nossa sociedade dita
“globalizada” é, contraditoriamente, extremamente fragmentada, sendo
economicamente excludente, socialmente violenta, politicamente abúlica
(“desideologizada”), culturalmente individualista e filosoficamente descrente
das possibilidades éticas do Homem de sempre e melhor reconstruir-se no
sentido de mais dignamente vivermos todos num mundo mais humanizado. Assim se a
“filosofia” dominante é a do irracionalismo combinada com a descrença no Homem,
só a Salvação no Além ou a esperteza individual aparecem como reconfortantes
“soluções” para as angústias terrenas. Daí, a fantasticamente exitosa
proliferação de livros, revistas, peças teatrais, novelas televisivas e filmes
místico/exotéricos e de auto-ajuda (os “Código da Vinci”, “O Alquimista”,
“Ghost”, “Como vencer na vida e influenciar pessoas”, “Pai rico, pai pobre” e
congêneres) serem marcantes expressões da já aludida fragmentação da visão
racional de mundo hoje prevalescente.
Para este contexto ideológico, muito
tem contribuído as progressivas inovações ocorridas, desde o século passado, no
tocante aos meios de comunicação de massa – o rádio, a TV e, mais recentemente,
a internet. A sistemática, instantânea e generalizada difusão massiva de
notícias díspares – desde “pílulas” de novidades técnico-científicas e
culturais até cenas diárias de violência irracional, passando por dados e
“análises” parciais e não isentas do cenário político -, não induzem a
construção, nas pessoas, de uma razoavelmente estável e integrada configuração
psicológica, na qual um quadro simbólico – conceitual e emocional – tenha
condições de se estruturar mediante a devida sedimentação, organização e
sistematização das informações da realidade.
Por outro lado, lembremo-nos que Marx
dizia que o Homem só se põe problemas para os quais antevê possibilidades de
solução. De fato, penso que todo este desalentador ambiente ideológico atual
haverá de ser positivamente superado num futuro não muito distante. Isto
porque, com base na dinâmica global que hoje percebo, acho que estão sendo
amadurecidas as condições históricas que propiciarão o desabrochar de um novo e
totalizante Sistema Filosófico – possivelmente formulado por um(ns)
pensador(es) oriundo(s) de um país emergente da atualidade -, que exercerá
neste século um papel análogo ao exercido pelo marxismo no século passado. Tal
sistema filosófico haverá de ter com o marxismo uma semelhante relação de
“incorporação”/superação que este teve com o hegelianismo. Espero que a
História venha a confirmar esta minha expectativa.
Obs. de 24/03/2015: Transcrevo a seguir o e-mail que o companheiro Luciano Mendonça me enviou em 09/03/2015, com comentários acerca deste meu texto.
Prezado Godofredo,
Li o seu texto Os
partidos políticos na crise de representação. Ótima
reflexão, tipo texto que temos que ler mais de uma vez para capturar
toda a informação
contida nele. No intento de dialogar contigo, tenho algumas
considerações a fazer a partir da
leitura.
-
Assim como o sociólogo Antonhy Guiddens, entendo que vivemos em uma etapa civilizatória que é melhor caracterizada como alta modernidade, pois as mudanças sociais que evidenciamos se dão graças ao sucesso do movimento iluminista, e não por causa de sua crise ou superação. Assim, continuamos na modernidade, e não em uma tal pós-modernidade
-
Considero o marxismo uma ciência do campo da economia politica, e não uma simples narrativa filosófica, como defendem os pós-modernos. A teoria da história de Karl Marx é tão científica como a teoria da evolução das espécies ou a da relatividade.
-
A teoria da história de Marx é o que existe de mais avançado nas ciências sociais, só a partir dela é possível desvendar a realidade do mundo social, superando as deturpações ideológicas que nos impedem de acessar essa realidade social.
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Marx usava o termo ideologia como ideia de falsa realidade. Mais tarde os marxistas passaram a usar o termo como visão social de mundo, “ideologia do proletariado”. Prefiro considerar ideologia como falsa realidade, e o marxismo como o meio de sua superação dessa falsa realidade.
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Não acredito que a superação do capitalismo venha a acontecer a partir dos países da periferia, o fim da URSS demostrou a impossibilidade de construção de uma sociedade socialista em meio a escassez, acredito que esse movimento só pode dar certos a partir de países centrais, Marx estava certo sobre isso.
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De uma forma ou outra, a luta principal será sempre entre os que detêm os meios de produção e os que não os detêm.
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Realmente vivemos uma crise da representação, e a sua solução deve passar pelo estabelecimento de mecanismo que permitam a transparência pública, a participação e o controle social da gestão, isso as tecnologias da informação e comunicação já permitem, é uma questão de vontade política.
Abraço,
Luciano.
Considerações por mim feitas e enviadas
ao companheiro Luciano Mendonça sobre seus comentários críticos a respeito do
meu texto “Os partidos políticos na crise da representação”:
1 – Entendo, como vários
pensadores de esquerda, que neste século XXI, o capitalismo vive uma nova
etapa. O advento da internet num mundo globalizado como nunca antes, é uma
revolução tecnológica que tem uma relevância estruturante para o capitalismo
atualmente hegemonizado pelo capital financeiro, análoga a que teve a máquina a
vapor para a 1ª Revolução Industrial e as energias elétrica e petrolífera para
a 2ª Revolução Industrial. Se esta atual fase do capitalismo deve ser chamada
de “alta modernidade” ou de “pós-modernidade” ou de “sociedade informacional” é
uma interessante discussão semântica sobre a qual não tenho uma opinião
conclusiva; daí ter posto, no texto, o termo “pós-modernidade” entre aspas.
2 – Um tanto esquematicamente eu
lembraria que Marx – cujos trabalhos, de fato, não foram uma “simples narrativa
filosófica”, mas, sim, altíssima Filosofia, uma “doutrina imensa” (Sartre) –
dizia que quando ocorrem transformações profundas na estrutura de um dado modo
de produção, consequentemente mudanças relevantes acontecem na superestrutura
política, jurídica e cultural (mundo filosófico incluso) da sociedade
considerada. Daí eu achar que neste século XXI, numa fase do capitalismo
estruturalmente distinta das do capitalismo dos séculos XIX e XX (ainda que em
todos os capitalismos haja a exploração da classe burguesa sobre as classes
sociais mais despossuídas), seria antimarxista imaginar-se que um aparato
conceitual forjado no século XIX pudesse dar conta plenamente – sem que sejam
reciclados alguns de seus enfoques fundamentais – dos desafios,
potencialidades, problemas e impasses postos pela nova realidade
econômica-social à análise dos pensadores de esquerda do mundo atual.
3 – Penso que o marxismo ainda é
“a filosofia insuperável de nosso tempo” (Sartre). Nenhuma outra filosofia tem,
até o momento, a sua potência cognitiva. Portanto, concordo quando você diz que
“a teoria da história de Marx é o que existe de mais avançado nas ciências
sociais”. Contudo, isto não me impede de achar também que o marxismo está em
crise, estagnado, necessitando de uma revitalização “que ainda está por fazer”
(Sartre), posto que, como escrevi, ele “hoje padece de insuficiências que o
tornam um sistema de pensamento incapaz de atender plenamente as demandas
intelectivas de uma intelligentsia às
voltas com perplexidades conceituais crescentes nos dias que correm”, inclusive
no campo dos valores éticos deste novo século.
4 – Assim, por achar o marxismo
“a menos impotente das filosofias existentes”, quando me perguntam qual é o meu
ideário político, eu digo: sou marxista e, pois, sou socialista. Porém,
marxistamente, considero que neste século XXI, pelas razões já apontadas, há
que ser buscada uma nova Teoria Filosófica que: i) incorpore “métodos” – os materialismos histórico e
dialético – e conceitos fundamentais de análise da História e da realidade das
sociedades humanas – como, por exemplo, o de que são os interesses conflitantes
das classes sociais que explicam o devir histórico – que Marx apresentou e que
fazem parte da História da Filosofia, da Ciência e da Política humanas; ii) supere dialeticamente aquelas
noções marxistas que estão historicamente defasadas – por exemplo, dentre
outras, a centralidade da classe operária industrial (não genericamente
“trabalhadores”) enquanto parteira prioritária da anunciada sociedade
socialista (hoje, na sociedade capitalista, o setor de serviços –
especialmente o bancário – tem mais peso do que o setor industrial, ao
contrário do tempo de Marx), e crie novos “métodos” de análise que estejam
sintonizados com sociedades capitalistas onde a opressão de classes se dá em
contextos cada vez menos bipolarizados (burguesia x proletariado) visto que as
ditas “classes médias” (pequena burguesia? nova classe trabalhadora?) tem peso
político e econômico crescentes.
5 – Creio que a
maior demonstração de que hoje o marxismo não tem mais o mesmo vigor ideológico
e a mesma capacidade orientadora da práxis
política dos socialistas que teve outrora, é o fracasso prático do
marxismo-leninismo, seja na versão stalinista, seja na trotskista. Afinal, o
leninismo foi, por muitas décadas, a referência maior do que seria “o
verdadeiro marxismo revolucionário”, e tanto a falência histórica do dito
“socialismo real” quanto a dos atuais partidos comunistas (salvo, talvez, o de
Cuba, da China?, do Vietnã?) me parecem testemunhos claros da crise (não
negação total) do pensamento marxista em particular, e da esquerda democrática
revolucionária em geral.
6 – Quando, no
texto, eu cogito a mera possibilidade de que um novo e necessário Sistema
Filosófico possa vir a ser um significativo avanço em relação ao marxismo, e de
que talvez a sua formulação pudesse advir de um país emergente da
atualidade, eu não estava a dizer que “a superação do capitalismo venha a
acontecer a partir dos países da periferia” como interpretaste. Acho mesmo que
o mais provável é que isto “só pode dar certo a partir dos países centrais”,
como você afirma com toda convicção, baseada em Marx (em se tratando de
História futura, eu prefiro falar de probabilidades antes que de certezas).
7 – Finalmente, não acho que a “solução” da atual crise da representação – dos partidos, sindicatos e congêneres – possa ser vista apenas como uma questão de “vontade política” ou de “participação e controle social de gestão” e de “transparência pública”. Tais questões podem, é claro, ajudar a minorar o problema, mas não a “solucioná-lo” em última instância. Em verdade, como eu disse na introdução do meu texto, creio ser esta uma questão ideológica que tem a ver com a atual crise do pensamento de esquerda – uma crise da Filosofia contemporânea -, visão esta que julgo não ser “ideológica” no sentido negativo (de “falsa realidade”) usado de maneira estrita por Marx em alguns contextos específicos.